Sem título, escultura que data do final da década de 1990, pertence ao momento em que o artista José Pedro Croft, depois de progressivamente abandonar o uso de materiais clássicos da escultura como o mármore, centra o seu discurso artístico na reflexão e questionamento das qualidades intrínsecas à própria escultura assim como na exploração das relações entre volume, espaço, escala e luz. A simplicidade da conjugação entre uma mesa e quatro espelhos duplos são a evidência formal da apropriação de objetos universais de uso quotidiano que, através do movimento de transposição para o espaço expositivo, perdem o seu sentido de funcionalidade. Os espelhos, em articulação com o elemento doméstico reconhecível e pré-existente em madeira, não só tornam impossível o seu uso como, em justaposição, despoletam um jogo de novas formas ocupando o espaço ausente. A devolução da imagem é assim alterada e a aparência dos pés da mesa parece ilusoriamente sofrer deformações e fazer surgir novos elementos. É, deste modo, resultado do gesto simples e provocador da perceção ambígua entre presença real e presença construída.
Este jogo de desfragmentação e desconstrução formal e espacial, através do uso de espelhos, tem acompanhado o trabalho de Croft, cujas qualidades explora até aos dias de hoje.
Sem intenção discursiva ou significados simbólicos e metafóricos estabelece a relação entre interior e exterior na ampliação do espaço que redefine a realidade pela sua manipulação, tendo como interveniente o espectador.                                                                            

Carolina Quintela