Obras
Gesto impossível para coagular o sangue dos rios
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Data
1955
Técnica
Aguarela, caneta de feltro e esferográfica sobre papel
Dimensões
20,6 x 15,5 cm
Integrado na produção dos anos vividos em Angola, porventura o núcleo de paleta mais feliz da sua obra, este desenho de 1955 apresenta características comuns a todo o corpo de trabalho do autor: a fusão da anatomia feminina com a paisagem, a inquietação geral de uma composição cujos elementos benignos se transfiguram em cenários de pesadelo, acentuando uma natureza dúbia e o recurso a elementos simbólicos que denotam o prazer do jogo com a herança da História da Arte.
Centrando a atenção inicial do espectador na grande mãe sacrificada (seios abundantes, como os de uma mãe que amamenta), esta figura feminina sobre uma mesa-altar sacrificial tem, na bonomia da expressão e a languidez do corpo (como se adormecesse tranquilamente), um franco contraste com o rasgamento dos traços vermelhos que escorrem da mesa, como uma cortina de sangue. Da sua mão cai o espelho em que decerto se refletiu momentos antes e agora revela uma lua vermelha, num crescente lunar do hemisfério sul.
Sob a mesa-ombreira, portal para um mundo vertiginoso (e quem deterá a sua chave?), para onde o olhar é atraído pelas diversas oblíquas que atravessam o desenho, descobre-se uma paisagem nua, sem árvores. O único elemento vegetal é a folha que cobre a cabeça da figura masculina que emerge do solo como um estranho e místico farol. A folha confunde-se com uma cabeça vista de perfil, simulando cabelo, barba, olho que irrompe, intranquilo. Quase virado para o espectador (uma ligeira inflexão à esquerda parece indiciar que este reflete um momento/paisagem passado), o espelho anuncia uma queda iminente, confirmada pela gravidade dada pelo fio de prumo.
Os traços acentuam a vertigem de pontos de fuga contraditórios (do solo e do ar), criando grande dinamismo na composição, rompendo a quietude das figuras. Escassas sombras das duas figuras contrariam a omnipresença da luz nesta paisagem de resto vazia e inóspita.
EF
Centrando a atenção inicial do espectador na grande mãe sacrificada (seios abundantes, como os de uma mãe que amamenta), esta figura feminina sobre uma mesa-altar sacrificial tem, na bonomia da expressão e a languidez do corpo (como se adormecesse tranquilamente), um franco contraste com o rasgamento dos traços vermelhos que escorrem da mesa, como uma cortina de sangue. Da sua mão cai o espelho em que decerto se refletiu momentos antes e agora revela uma lua vermelha, num crescente lunar do hemisfério sul.
Sob a mesa-ombreira, portal para um mundo vertiginoso (e quem deterá a sua chave?), para onde o olhar é atraído pelas diversas oblíquas que atravessam o desenho, descobre-se uma paisagem nua, sem árvores. O único elemento vegetal é a folha que cobre a cabeça da figura masculina que emerge do solo como um estranho e místico farol. A folha confunde-se com uma cabeça vista de perfil, simulando cabelo, barba, olho que irrompe, intranquilo. Quase virado para o espectador (uma ligeira inflexão à esquerda parece indiciar que este reflete um momento/paisagem passado), o espelho anuncia uma queda iminente, confirmada pela gravidade dada pelo fio de prumo.
Os traços acentuam a vertigem de pontos de fuga contraditórios (do solo e do ar), criando grande dinamismo na composição, rompendo a quietude das figuras. Escassas sombras das duas figuras contrariam a omnipresença da luz nesta paisagem de resto vazia e inóspita.
EF