Obras
Sem título
painting


Data
1970
Técnica
Acrílico sobre contraplacado
Dimensões
100 x 80 cm
Muito solar na sua paleta de amarelos, ocres e verdes luminosos entrecortados por ocasionais castanhos, esta composição, construída como uma sucessão de telas sobrepostas, abre janelas sobre paisagens sucessivas e sucessivamente cobertas, de onde alguns elementos parecem ir transitando de planos para planos.Labirinto de sentidos, labirinto de narrativas, os assuntos sucedem-se como portas que abrem para outras portas, permitindo renovados sentidos. Fragmentos de corpos, formas geométricas, fundos lisos e céus tormentosos atravessam os diversos níveis da composição, propondo uma abordagem que atenta também ao crescente valor do fragmento na contemporaneidade. Cor e formas jogam aqui uma duplicidade de efeitos, como se quisessem, simultaneamente, evocar e negar a tridimensionalidade da superfície.Sem perder os elementos reconhecíveis da sua gramática habitual, dos fragmentos de corpos transmutados às evocações de paisagens quase lunares, pelo despojamento e pela lisura inquientante dos fundos, esta pintura adota uma clara modernidade na abordagem ao fragmento. Ligando o universo surrealista a mais amplas questões da percepção, opera pela cor o que no desenho o autor concretiza com a linha de contorno. Assim, as superfícies cromáticas contrastam zonas lisas com outras em que as cores se misturam. Propiciando a ilusão de volume, essa abstratização das formas demonstra também o gosto de Cruzeiro Seixas pelo desenho, que aqui se infiltra no gosto do contorno de algumas formas.Para além das perturbadoras metamorfoses de inspiração onírica, encontramos aqui um claro equilíbrio entre a estrutura geométrica e as formas também geométricas que vão vogando de plano em plano. Esse sentido de simetria e de ordem é contrariado pelas formas orgânicas e voluptuosas que as enquadram. Com toda essa busca da complementaridade, esta composição sugere a simultaneidade de experiências, de símbolos e de camadas existentes em cada imagem ou em cada momento das nossas buscas de sentido.Emília Ferreira